Thursday, January 31, 2008

No Vale dos Lamentos...


No vale dos lamentos escutam-se perdas angustiadas pela insensibilidade social, admiram-se amargamente retratos gastos pela poeira do tempo, valores esquecidos pela ambição de uma coroa de nada valiosa mas de suposta distinção...
Seremos apenas vulto de gente, fugaz temperamento interessado pelo materialismo que nos rodeia, nos ofusca, nos absorve...
No vale dos lamentos vagueiam remorsos, soam sinos da incredulidade interior, cobre-se pelo pó do esquecimento a verdadeira essência do sentir...
Poderei confiar na eternidade de um pensar?
Poderei atraiçoar convicções agora desconhecidas, "nuncas" que, afinal têm-se revelado, de sorriso estampado, ironicamente proferindo "eu soube esperar..."
Por este vale de penumbra, decorado caminho, perplexo existencialismo sem fundamento, em julgamento, procurando O sentimento...
Serei também um desses vultos caminhantes, intrusos pressupostos de uma maneira de ser, esquecida por momentos ou perdida num para sempre...
No vale dos lamentos percebo olhares de tormento, faces enrugadas pelo arrependimento, gestos ténues de incerteza, vultos perdidos, corajosos espectros na procura de um conteúdo guardado em local desconhecido...
No vale dos lamentos caminho... neste espaço de breu esmagado reencontro um eu, surpreso, desconfiado, receoso, descontrolado...
Mas no final compreendo, pelo vale dos lamentos caminho, o mesmo eu, o mesmo conteúdo, o mesmo vulto...

Thursday, January 24, 2008

Sinceridade


Palavra morta de significado, assassinada por mãos inconscientes quais tentáculos expressivos da distorção do raciocínio humano...
Tento compreender de onde provêm a inspiração da mentira, procuro descobrir a infundada razão para justificar a ausência do carácter mas nada encontro...
Serei um ser iludido, envolto pela névoa do querer acreditar que a expressão do pensar poderá corresponder ao significado do pensamento?
Serei apenas demente personagem, ingénua janela do acreditar na procura de um pouco de tranquilidade, de resposta, de conteúdo...
Estarei para sempre de luto por este crime, chorando no seu adeus, culpado por ser também assassino...
Seres humanos que se desprendem da humanidade, seres pensantes que crucificam o pensar, seres que sentem... mas esquecem que os outros também o fazem...
Sinceridade...
Tenho consciência que por condicionalismos da sociedade quase que somos obrigados a apunhalá-la por vezes, forçados a um distorcer do que é real, incitados a preclitantes deturpações da veracidade da existência, do fundamento do acontecimento... Contudo entristece-me a facilidade do contágio deste recurso, intuito de causa esperada, quando se pretende usar a máscara da falsidade...
Não sou melhor que ninguém, não pretendo criticar nem julgar, apenas continuarei a sonhar que, um dia, encontrarei na descendência desse precioso conteúdo, uma retribuição, um reconhecer da pureza do discurso, na despretensão do agradar, na simplicidade do dar a conhecer a face oculta por detrás da máscara, um agir desvinculado de um propósito, um não espezinhar o que se encontra no nosso caminho... Até o mais minúsculo dos seres tem direito à sua expressão...
Sinceridade... sepultada por muitos mas lembrada por outros... se no remorso poderás cravar a tua expressão, na lembrança ganharás coragem para não te dissipares na bruma do tempo...




Tuesday, January 22, 2008

(Des)Acreditar

Não acredito em alma gémea, elemento transportado de narrativas intemporais para o quotidiano social, pela necessidade desse acreditar que tal metade poderá complementar um eu fragmentado, que poderá incorporar um corpo obsoleto de esperança...
Acredito na cumplicidade, na sintonia de um olhar, do palpitar da essência causado por uma palavra sincera, na implosão interior provocada por um sorrir de alma...
Não acredito no amor eterno, imortalização idealizada do momento, mumificação de um querer sentir para sempre, procura da fortaleza eterna da fraqueza do sofrer, do querer purificar a mente da possibilidade de um desaparecer...
Acredito na falsidade intencional da atitude, de conclusão indefinida, de mágoa pressentida, mas como que amada pela possibilidade de um desfecho, qualquer que seja...
Não acredito em ilusões, iludo-me com o tanto querer que pudesse acontecer, mais uma vez, rever um brilhar nesse espelho de mim...
Acredito que sou apenas eu, explosão de conflito, expiação de um tormento incompreendido, concebido na intrincada trama da confusão, perturbado por não saber quem sou...
Não acredito que o amanhã trará a sublime intensidade do inesperado, a agradável surpresa da miragem de um ser feliz, a conquista da realização...
Acredito que na tristeza do olhar nego o sorriso, que num destroçado pensar contradigo a palavra proferida, renego o significado que tanto quero demonstrar...
Desacreditar...
Causa ou consequência da escolha?
Descanso ou fuga à solidão?
Medo ou fraqueza diluídos no turbilhão do conflito?
Acreditar ou não acreditar que, afinal, no amanhã o imprevisto poderá ser personagem da minha tão estilhaçada história?
Desacreditar... mérito conquistado pela atitude.

Muralha


Na muralha das contradições vislumbro o adormecer de mais um dia, contemplo o adeus do sol gritando pela intensidade das suas cores a promessa de um regresso, ferindo o olhar com a beleza da sua despedida...
No peso da história gravada em pedra, muralhas que me cercam, ouvintes devotos, entrego-me inadvertidamente ao suplício do pensar, às interrogações erradamente julgadas escondidas nas fendas dessa cerca de pedra, nessa barreira protectora qual armadura de um eu fragilmente omnipresente...
Contradições do pensar, controvérsias do sentir, contratempos no agir...
Serei aquilo que digo ou direi aquilo que sou?
Procurarei a perfeição ou esconder-me-ei na utopia de uma procura?
Conseguirei pela palavra revelar o intransmissível significado do meu pensar?
Serei reflexo obtuso de um conteúdo transparente, apenas reconhecido por olhos de ninguém?
Poderei encontrar algo que não procuro?
Por contradições me reconheço, numa despedida aquecida por tons de ouro sem valor, mais uma vez constato que não encontro respostas, que não pretendo um esclarecer a este mistério que nada esconde mas tudo me quer desvendar...
Na muralha das minhas contradições assisto a mais um embalar dos sentidos, a um arrefecer das dúvidas, a um sonhar acordado na crença de que não importa o que está no final do caminho, mas sim o que o percurso nos revela...
Muralha do meu ser, refúgio das minhas contradições...

Sunday, January 20, 2008

Fado de mim


Por ruelas de noite vestidas, escuto passos de um corpo deambulante, perdido em convicções já não conhecidas, errante por contradições lançadas ao tempo, quais bolas de sabão sopradas pela inocência de uma criança...
Nessas ruas caminho, absorto por idealismos irreais, hipnotizado pelos poderes do querer, fascinado pela crença do encontrar. Serei racional? Viverei num mundo paralelo em que o sonho pode comandar o amanhã?
Em todos os recantos escuros, becos escondidos nas profundezas do ser, caminho, procurando respostas...
Serei apenas um sonhador?
Pela calçada dessas ruas do tempo, vagueio solitário, em consonância com as vozes que sussurram promessas de um encontro, em instante incerto, com o olhar da certeza...
Em sintonia com o brilho da noite escuto sons de origem não compreendida, choro de uma guitarra tocada por mãos de sentimento...
Sinto-me embalado, extasiado pela incontrolável invasão interior que esta musicalidade tem em mim...
Elevam-se sentidos desconhecidos, apuram-se sensações esquecidas, renascem cinzas de um fogo apagado, escórias da fragilidade imposta como defesa à adversidade, à confrontação...
Nessas cordas dedilhadas por alguém incerto, notas entrelaçam-se numa melodia, tons conjugam-se em sublime harmonia... surge pela voz da alma os primeiros sons deste meu fado, canção do meu destino, voz que me canta, canto da minha voz...
Por ruelas pela noite abraçadas, os meus passos ecoam na ausência da concretização, mas confiantes por acompanhados pelo meu fado, pela melodia de mim, pelo canto do meu ser...

Saturday, January 19, 2008

Moinhos de Vento


Pelos Moinhos de Vento do meu tempo deslizam fiapos do acontecer, pétalas de tristeza perfumadas, estrelas brilhantes de penumbra, sorriso contornado por uma lágrima...
Moinhos de Vento... por eles sopram histórias de vida, instantes tatuados na alma, para sempre cicatrizes na memória...
Por esse pano gasto segredam-se confissões de culpabilidade incalculada, sussurram-se razões de um agir despretensioso, demonstram-se afectos concebidos na subtileza de uma sinceridade contagiante...
Velas de pano perdido, qual sonho fugido por um acordar forçado, qual grito de som vazio, qual inutilidade do ser, aquela que sinto, pelo vento que move o meu Moinho...
Moinho de Vento... lar dos meus receios, abrigo dos meus actos, refúgio dos meus sentidos...
Mó em que me sento, que descanso o peso que carrego no espírito, que lanço ao vento que move estas velas, os meus tormentos... a mágoa por ser apenas um alguém, privado de dom, vazio do poder mudar o acontecer...
Moinhos de Vento... sereis testemunha de uma promessa, não lançada ao vento mas para sempre guardada sob o peso desta pedra em que me sento... Sentirás sempre a minha mão no teu ombro, seja qual for o caminho a seguir, qual escolha a feita por um destino tantas vezes incerto...
Moinhos de Vento... histórias sopradas pelo calor de um confiar...

Sunday, January 13, 2008

É no pensar...

Tamanha pequenez de uma razão que não encontra fundamento, cegueira do momento, invalidez da atitude que não encontra certeza, que caminha por trilhos desconhecidos, incertos, estranhas passagens do meu rumo...
Desconheço quais as vontades dos meus passos, sigo entre ruelas pelas quais não sei se quero seguir. Injustiça de personalidade, fraqueza do querer, incerteza do não querer...
Sou alvo do instante, seta da realidade, frio metálico que me arrepia, chama que poderá incendiar a genuinidade do acontecimento...
Não minto, não finjo, não me escondo pela máscara da falsidade simplesmente não sei...
Conseguirei, mais uma vez, desmoronar a beleza de um castelo de areia, construído na compreensão, edificado na pureza de uma meneira de ser, fortalecido pela fugaz capacidade do retribuir...
Não quero ser pecador por actos não calculados, não quero ser mártir do remorso, não quero ser injusto com o pensar...
É urgente encontrar-me, mas necessito perder-me para prosseguir... Soltar a âncora da recordação, deitar-me num sono de choro pelo erro, sofrer pelas escolhas, pelos finais dos meus teatros, pelas personagens das histórias que me conto, nas quais tanto quero acreditar que chego a nelas habitar...
É no pensamento que encontro todas as respostas, todas as questões, grande parte da energia que me alimenta... É no pensar que me encontro e é no pensar que me perco... É por tanto pensar que nada sei, que de nada tenho certeza...
Queria, por vezes, conseguir não pensar, apenas viver...

Sunday, January 6, 2008

Chove...


Por gotas de um choro de alma perdida, chuva por nome conhecida, escorrem passagens de tempo, escoam lágrimas do acontecer, inevitável aplaudir ao significado do instante, esboço de um sorrir de saudade...
Saudade... invade-me a todo o instante, é lágrima dessa minha chuva que molha, envolve, aquece... É choro da memória, é grito enlouquecido pela magnitude de um não esquecer, é suspiro de âmago que deambula pelos caminhos do recordar...
Sim, sinto saudade... palavra sofrida pela consciência premeditada de passado, do aconteceu, do acabou...
Chove em mim...
Por este retrato do meu eu, pinceladas de uma tinta sem cor, criam a imagem que não se vê em espelhos, que não é focada em fotografia de segundo, que não é visionada por olhos desconhecidos, que não é captada em filme inanimado...
Retrato de mim... vislumbrado na pureza dessa chuva que me inunda, visto por olhos de quem me quer ver, compreender, sentir,,,
Contemplo o meu céu, sinto na cara o suspiro desta chuva, o sussurro do seu segredo, a confissão dos seus tormentos, o tumulto dessas lágrimas que se afirmam sentimentos...
Chove...
Não procuro abrigo, não fujo desta chuva, não receio o fraquejar deste gelado beijo...
Olharei para sempre erguido este meu céu de onde escorrem tais lágrimas do agradecer, choro do sorrir, tristeza do poder nelas encontrar a felicidade...
Nesta chuva fundirei as minhas lágrimas, neste choro sem voz gritarei que não quero ser visto, quero ser sentido, compreendido tal como um poeta da lua sente onde encontrará sempre o seu brilho...
Chove... lágrimas de mim...